domingo, 21 de julho de 2019
João Carlos Scholtz, o Jardim José do Canto e as plantas
João Carlos Scholtz, o Jardim José do Canto e as plantas
No passado dia 2 de julho, no âmbito de uma ação de formação do pessoal docente promovida pela Escola Secundária das Laranjeiras, depois de, numa sala da escola, ter sido abordada, pelo formador, a vida e a obra daquele vulto da sociedade micaelense, realizou-se uma visita de estudo ao Jardim José do Canto.
Antes da realização da primeira atividade que constou de um “peddy paper”, um dos participantes chamou-me a atenção para o nome da rua que fica ao lado da Escola EB1/ JI de Matriz (Anexas), o qual contradizia o que havia sido afirmado na formação. Com efeito, o formador havia dito que a construção do Jardim José do Canto havia começado em setembro de 1846 e na placa do nome da rua pode ler-se o seguinte: João Carlos Scholtz – impulsionador do Jardim José do Canto no século XVIII.
Tendo em conta que João Carlos Scholtz (1741-1823) faleceu três anos depois do nascimento de José do Canto e vinte e três anos antes daquele ter criado o seu jardim, a informação constante na placa não pode estar correta.
Podia ter ficado por aquela constatação, mas como aquele nome não me dizia nada, decidi tentar saber quem fora João Carlos Schotz e se o mesmo tinha alguma ligação a jardins ou à botânica.
João Carlos Scholtz que foi comerciante e cônsul da Rússia e da Prússia possuiu uma casa numa Quinta na Arquinha, onde era possível encontrar uma grande variedade de plantas.
Recorrendo ao livro “Quintas, Jardins e Parques da Ilha de São Miguel (1785-1885) da investigadora da Universidade dos Açores, Isabel Albergaria, fica-se a saber que a João Carlos Scholtz é atribuída a introdução do incenso (Pittoporum undulatum), espécie oriunda do sudoeste da Austrália, hoje, muito usada em sebes e que na sua quinta era possível encontrar um tulipeiro (Liriodendron tulipífera), oriundo da América do Norte, e um Laurus canariensis, “o primeiro exemplar de uma espécie erradamente popularizada na ilha como árvore da cânfora”. Para além do referido, também, existia uma magnólia e palmeiras.
Relativamente a esta última espécie a questão levantada tem razão de ser pois Laurus canarienses é o nome científico, não atual, do louro ou loureiro, não se tratando, portanto de uma canforeira.
Ainda em relação a esta última espécie referida, que em meados do século XIX atingia a altura de 30 metros e que necessitava de quatro homens para a abraçar, poderá ter havido um erro na sua classificação pelo naturalista Drouët.
Na publicação “Observações sobre a ilha de São Miguel recolhidas pela Comissão enviada à mesma ilha em agosto de 1825 e regressada em outubro do mesmo ano”, Luís Mouzinho da Silva Albuquerque e o seu ajudante Ignacio Menezes referem o seguinte:
“…A esta parte da cultura da ilha prestou importantes serviços o falecido prussiano João Carlos Scholtz, aclimatando nela diferentes árvores exóticas, propriíssimas para servirem de abrigo às laranjeiras, entre as quais se nota o Laurus camphora, que hoje é assaz comum na ilha, e cujo primeiro tronco se conserva na quinta…”
Será que estavam a referir-se à mesma árvore a que Drouët atribuiu uma classificação diferente?
A Laurus camphora que atualmente é denominada de Cinnamomum camphora é a canforeira e não sendo muito comum pode ser encontrada em alguns jardins, existindo no Jardim José do Canto alguns exemplares de um porte digno de registo.
Relativamente ao uso da canforeira, até agora não tenho qualquer referência que mencione a sua utilização em sebes. Para além do seu uso, entre nós, como planta ornamental, Alfredo da Silva Sampaio, na sua “Memória sobre a Ilha Terceira”, publicada em 1904, inclui a canforeira numa lista de plantas empregadas em construções e na marcenaria.
João Carlos Scholtz que, segundo Francisco Maria Supico, teve uma “opulenta posição comercial e correspondente representação na sociedade”, foi também um apaixonado pela botânica, tendo, de acordo com Briant Barret, numa propriedade sua existente nas Socas introduzido “…as melhores flores da Europa, árvores de boa madeira, bem como outras plantas, ainda não existentes nas outras ilhas”.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores 31879 de 18 de julho de 2019 p. 16)
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